A difícil comunicação amorosa

24 de janeiro de 2011





Por que a conversa sempre acaba em briga? 

Regina Navarro Lins discute o tema e apresenta a “educação para amar”


Lana, uma médica de 38 anos, é casada há nove anos com Pedro, também médico. Desanimada com o rumo do relacionamento, me procurou para fazerem terapia de casal. Na primeira sessão em que compareceu junto com o marido, foi logo dizendo: “Não tenho dúvida de que amo o Pedro, mas acho que nosso problema de comunicação é irreversível. Não é de hoje que conversamos sobre isso, mas não adianta. Se eu digo o que estou sentindo, mostro o que me magoa, ela entende tudo ao contrário e reage mal. Diz que estou criando caso à toa, inventando histórias. Acha que sempre tem que ter a última palavra. É como se ele vivesse numa época em que o homem tinha sempre razão e a mulher tinha que se submeter a tudo. Pedro também não está feliz; reclama muito de não ser entendido. “Ela acha que eu não me importo com a nossa relação, quando na verdade não penso em outra coisa. Em alguns momentos não vejo outra saída que não seja a separação.”


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“O ser humano está nos primórdios da comunicação, apenas no limiar de abandonar a etiqueta destrutiva, o fútil jogo das aparências.”, afirma o historiador inglês Theodore Zeldin. Para ele, o ruído do mundo é feito de silêncios, na medida em que é muito difícil a verdadeira comunicação entre as pessoas. Há incompreensão e desentendimento nas conversas. Na maior parte dos encontros, orgulho ou cautela ainda proíbem alguém de dizer o que sente no íntimo. É um desperdício de oportunidades sempre que um encontro se realiza e nada acontece. No passado a comunicação era criada para, principalmente, dominar os outros e era usada para passar informações e se dizerem coisas que eram esperadas pelas pessoas. Havia uma obediência à etiqueta, que era mais importante do que ser sincero.



Para Zeldin, precisamos de uma nova meta: desenvolver, não simplesmente a arte de falar, mas a verdadeira arte da conversa, que, esta sim, é capaz de mudar as pessoas. Estamos nos primeiros estágios de aprendizagem de como se falar com outro. Estamos na infância da comunicação. Uma boa conversa é estimulante e irresistível; não é só transmitir informações ou compartilhar emoções, e tampouco apenas um modo de colocar ideias na cabeça de outras pessoas.



Toda conversa, diz o historiador, é um encontro entre espíritos que possuem lembranças e hábitos diversos. Quando os espíritos se encontram, não se limitam a trocar fatos: eles os transformam, dão-lhes nova forma, tiram deles implicações diferentes, empreendem um novo encadeamento de pensamentos. “Conversar não é apenas reembaralhar as cartas: é criar novas cartas para o baralho. O aspecto da prática da conversa que mais me estimula é o fato de poder mudar os sentimentos, as ideias e a maneira como vemos o mundo, além de poder mudar até mesmo o próprio mundo.”, acredita Zeldin.

Na maioria das vezes não é o que acontece. A comunicação amorosa é, há muito tempo, prejudicada pelo antagonismo entre os sexos. Famílias, escolas, meios de comunicação, ensinam às crianças modos de ser e de se relacionar que os condicionem a se ajustar aos modelos estabelecidos. Isso implica na aceitação incondicional dos papéis até agora desempenhados por homens e mulheres.
Um artigo escrito por dois psicólogos americanos no Journal of Sex Research, analisa como os roteiros de “machos” fazem parte de uma ideologia na qual os homens são vistos como superiores às mulheres, e as emoções associadas com a masculinidade são consideradas superiores às associadas com a feminilidade.


Somente alguns tipos de sentimentos, como repulsa, raiva, desprezo, são “masculinos”, ou seja, sentimentos adequados a quem tem de dominar. Para garantir que aprendam a ser adequadamente “masculinos”, os meninos também são ensinados a desprezar e repelir as emoções “femininas” de medo e vergonha e, assim, nunca admitir que estejam com medo ou errados.

Entretanto, educadores progressitas começaram pela primeira vez, nos EUA, a abordar a educação para amar, ou seja, a educação para a alfabetização emocional —, para ajudar os estudantes a aprender maneiras de ser e de se relacionar que os capacitem a se ajustarem a uma sociedade de parceria, e não de dominação. Essa educação está sendo introduzida lentamente no currículo escolar.
Há escolas que ensinam seus alunos de literatura e história a empatia por meio do que chamam de “monólogos interiores”, nos quais os estudantes são encorajados a pensar a partir da perspectiva dos diferentes personagens na história, na literatura e na vida. Outra escola tem como objetivo elevar o nível da competência emocional e social das crianças como parte da educação. Como exigência para alunos do ensino médio, uma escola na Califórnia pretende estimular dimensões da inteligência quase sempre omitidas: sensibilidade em relação aos outros, autocompreensão, intuição, imaginação e conhecimento do corpo.


Vivemos um processo de profunda mudança das mentalidades. Quem sabe daqui a algum tempo vamos poder nos comunicar de forma bem mais satisfatória com as pessoas que nos cercam?




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Andressa Bragança